top of page
O SACERDOTE DE NEMI
 

Havia no bosque sagrado uma certa árvore, em torno da qual, a qualquer hora do dia e provavelmente até tarde da noite, uma figura sombria podia ser vista rondando de guarda. Levava na mão uma espada nua e todo o tempo olhava cautelosamente à volta, como se esperasse ser atacada a qualquer momento por um inimigo. Era sacerdote e assassino, e o homem a quem espreitava iria matá-lo, mais cedo ou mais tarde, para ocupar seu lugar como sacerdote. Era essa a regra do santuário. O candidato ao ofício sacerdotal só poderia ascender a ele matando o sacerdote e, concluído o assassinato, ocupava o posto até chegar a sua vez de ser morto por alguém mais forte ou mais hábil. É verdade que esse posto, em que ele se instalava tão precariamente, conferia o título de rei: mas certamente nenhuma cabeça coroada jamais esteve tão pouco segura sobre os ombros, ou foi visitada por piores sonhos, do que a sua. Ano após ano, no verão ou no inverno, com bom ou mau tempo, o rei do bosque tinha de manter sua solitária vigilância e, toda vez que se arriscava a um cochilo agitado, fazia-o com perigo de vida.

O TÍTULO DE SACERDOTE
Porque era chamado de rei do bosque?

A associação de um título real a deveres sacerdotais era comum na Itália e na Grécia antigas. Em Roma e em outras cidades do Lácio, havia um sacerdote chamado rei sacrifical ou rei dos ritos sagrados, e sua mulher tinha o título de rainha dos ritos sagrados. Na Atenas republicana, o segundo magistrado anual do Estado era chamado de rei, e sua mulher, de rainha; as funções de ambos eram religiosas. Muitas outras democracias gregas tinham reis titulares, cujas atribuições, pelo que conhecemos, parecem ter sido sacerdotais, centralizando-se em torno do lar comum do Estado.

Essa combinação de funções sacerdotais com autoridade real é conhecida de todos. A Ásia Menor, por exemplo, foi sede de várias grandes capitais religiosas, habitadas por milhares de escravos sagrados e governadas por pontífices que tinham uma autoridade ao mesmo tempo temporal e espiritual, como os papas na Idade Média. Zela e Péssimo foram dessas cidades dominadas por sacerdotes. Também os reis teutônicos, nos velhos tempos do paganismo, parecem ter desempenhado funções e conhecido poderes de sumos sacerdotes. Os imperadores da China ofereciam sacrifícios públicos, cujos detalhes eram regulados pelos livros rituais. O rei de Madagáscar era o mais alto sacerdote do reino. Na grande festa do Ano-Novo, quando um boi era sacrificado em prol da felicidade do reino, o monarca presidia ao sacrifício pronunciando preces e ações de graças enquanto seus assistentes abatiam o animal.

ENTENDENDO
UM POUCO MAIS
Castigando os deuses.

Era comum que os reis antigos fossem também sacerdotes, estamos longe de ter esgotado os aspectos religiosos de suas funções. Naquela época, a divindade que envolvia um rei não era uma simples figura de retórica, mas a expressão de uma crença concreta. Os reis eram reverenciados, em muitos casos, não apenas como sacerdotes, ou seja, como intermediários entre o homem e o deus, mas propriamente como deuses, capazes de conceder aos seus súditos e adoradores, bênçãos que habitualmente se supõe estarem fora do alcance dos mortais e que só podem ser obtidas, quando o são, pela oração e pelos sacrifícios oferecidos a seres invisíveis e sobre-humanos. Assim, esperava-se, em muitos casos, que os reis proporcionassem chuva e sol nas devidas estações, fizessem crescer as plantações e assim por diante. Por mais estranhas que essas expectativas nos pareçam, estão de acordo com os modos primitivos de pensar. Um selvagem dificilmente concebe a distinção, feita habitualmente pelos povos mais adiantados, entre o natural e o sobrenatural.

"

         Nos Estados monárquicos que ainda mantêm sua independência, entre os galas da África oriental, o rei faz sacrifícios no alto das montanhas e regula a imolação das vítimas humanas. A pálida luz da tradição revela uma união semelhante do poder temporal com o espiritual, de atribuições reais e sacerdotais, nos reis daquela aprazível região da América Central cuja antiga capital, hoje sepultada sob a densa vegetação da floresta tropical, é assinalada pelas imponentes e misteriosas ruínas de Palenque.

"

BUSCANDO FONTES

Por si mesmas essas conclusões não bastam, evidentemente, para explicar a peculiar regra de sucessão do ofício sacerdotal. Mas talvez a pesquisa de um campo mais amplo nos possa levar a pensar que encerram o germe da solução do problema.

 

MAIS FONTES:

bottom of page